quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O intruso do sótão (cap. 2)


Pelo visto, aquela seria uma longa noite.
Era nisso que Helena estava pensando enquanto passava pela, olhando para os olhos curiosos.
O que foi? Ela quis perguntar. Nunca viram alguém carregando um colchão?
Ela tentou ignorar os olhares curiosos em sua direção. Talvez o fato de ela estar mal- arrumada e com óculos escuros ajudasse a parecer uma delinqüente juvenil, mas eles eram necessários. Se alguém a visse, era o fim do plano. Com escuridão e óculos escuros, não iriam nem suspeitar, ou assim ela pensava.
Parou em frente à porta do casarão. Seria uma linda casa, daquelas que parecem do século dezoito, se não estivesse abandonada. Havia alguns rumores horríveis sobre a casa. Uma linda família, de cinco pessoas (pai, mãe, dois filhos e uma filha), moravam ali. O pai se viciara em jogos por que os filhos brigavam pela herança, e fora a falência. Um dos irmãos morreu pelo outro, o pai surtou, matou toda a família e cometeu suicídio. Helena se arrepiava ao recordar a história, mas ela era uma mentira. Tinha certeza, porque pesquisara os registros da casa na prefeitura. A casa pertencia a Margaret Dailes, que morrera de câncer sem deixar herdeiros. Nínguem quis comprar a casa por causa dos rumores, e ela então ficou sob domínio da prefeitura que não a demoliu, mas também não cuidou dela.
Tudo bem. Vamos lá.
Helena girou a maçaneta e empurrou a porta, que não estava trancada por dentro. Pegou o cadeado que estava na porta e testou a combinação: 7349. Realmente, os rumores estavam certos. Carregou as coisas para dentro e trancou a porta com o cadeado.
Andou pela casa decidindo onde iria dormir. Resolveu dormir perto da porta, nas sala. Era um ponto estratégico: só ela e algumas pessoas conheciam a combinação, de modo que seriam poucas as chances de alguém entrar pela porta. Se tentassem entrar pela janela ela ouviria, o que daria tempo de escapar pela porta dos fundos, já que a probabilidade de alguém cercar a da frente era sempre óbvia. Mesmo assim, ela tentou pensar em todas as possibilidades, e contou com um aviso prévio das amigas. A calma não era um ponto forte de Helena, assim como a estratégia. Ela não sabia se nascera com eles, ou se os desenvolveu ao longo dos anos. Mas sempre ajudavam em horas críticas, mesmo que tivessem pequenas falhas.
Ela andou até a cozinha, e checou o cadeado. A cozinha era, com certeza, o cômodo mais feio da casa. Era sujo e mofado, por estar abandonado a muito tempo. As três cadeiras estavam apoiadas na mesa torta, algumas sem pernas. Os armários estavam tortos e quebrados, contendo vidros e potes cheios de mofo. Helena achava aquilo repulsivo; tinha um nojo extremo de fungos.
Não estava com nem um pouco de sono, ainda não passavam das sete e meia. Decidiu andar pela casa. Subiu uma escada, segurando a lanterna. O segundo andar não tinha a mesma luz fraca vinda do poste da rua, que entrava pelas vidraças embaçadas.
Ela estava com medo, ma mesmo assim foi. As pessoas precisam enfrentar seus medos. Precisamos mostrar que somos maiores que eles. Era o que Helena pensou para se motivar, enquanto subia as escadas. Ela entrou na primeira porta aberta que viu. Lá havia um quarto grande, com uma cama larga e uma penteadeira. A cama estava bem arrumada, com travesseiros e lençóis empoeirados, como se esperando um visitante. O espelho da penteadeira estava embaçado, mas ainda podia-se ver um pouco do reflexo bonito de Helena. Em cima da penteadeira havia alguns perfumes, uma escova de cabelo e um batom vermelho-vivo, corroído pelos fungos. Havia também uma armário, quase atrás da porta, que ela não havia notado antes.Tentou abrir uma das portas, que rangeu e abriu em um solavanco.Não havia nada dentro.
Ignorando a poeira, Helena arrancou a cortina de retalhos, revelando mais uma vidraça enfumaçada, também bem abaixo de um porte. Helena conclui que, mesmo no século dezoito, quando a casa fora construída, já havia postes iluminação, só que como lamparinas, que precisam de óleo. As janelas deviam ter sido estrategicamente projetas, para aproveitar a luz da rua, enquanto estivesse acesa. Helena rumou então para a porta do lado esquerdo, que também era um quarto. Havia uma cama de solteiro, sem colchão. Uma escrivaninha pousava sozinha em um canto, sem nada em cima. Havia várias velas e uma caixa de fósforos dentro da gaveta. Mas Helena notou um pequeno detalhe, que não teria visto se não tivesse olhado por um tempo, medindo os detalhes. Sua inteligência só ressaltou um pouco o que ela já tinha, que era a observação. A caixa de fósforos e as velas eram recentes. Como ela sabia? Simples: elas não estavam cobertas por uma camada de pó. E uma das velas estava na metade, com o pavio queimado. Alguém estivera lá recentemente.
Helena ficou apreensiva. Estava com medo. Medo de que alguém a visse lá.
Quando escutou barulhos.




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2 comentários:

  1. Acompanhando essa intrigante história.
    O modo como você escreve e explana os acontecimentos é de dar água na boca pela leitura!
    Não pare de escrever, sei que tem leitores assíduos aqui que como eu esperam ansiosos por mais. :)

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