domingo, 30 de janeiro de 2011

O intruso do sótão (Cap.2, parte 5)

Já eram duas da manhã, e Helena estava em sono profundo. Max andava devagar de um lado para o outro da sala, ainda preocupado com a possibilidade de ser pego pelo pai de Helena. Já ela mesma não dava tanta importância, sendo que o pai não ligara uma única vez. Mas, no fundo, ela sabia que seria pega, mais cedo ou mais tarde e quando isso acontecesse, não queria Max por perto, para poder assistir.

Ele se sentou do lado dela, que estava adormecida no colchão. Os lábios delicados estampavam um leve esboço de sorriso, o que fazia Max acreditar que ela estava sonhando. Mas o sorriso não era por um sonho, mas por que este fora embalado pela fantasia de ter Max por perto, a noite toda, e de que ele a vigiaria. Ela imaginava-se como em uma cena de cinema, na qual o herói protege a menina a todo custo, mas sem deixá-la um só momento. Ele queria, de fato, protegê-la, mas não sabia como.

Movido pela curiosidade de descobrir sua própria reação, Max roçou a ponta dos dedos na bochecha de Helena. A menina não deu sugestões de acordar, o que o decepcionou. Ele se levantou e saiu, andando pela casa como antes. Junto ao travesseiro, ela sorriu, abrindo os olhos. Queria levantar e abraçar Max, mas sempre que pensava nisso, ela via nele as feições de Tiago. Não queria admitir, mas ainda gostava dele. Não o havia esquecido. Talvez nunca esquecesse. Helena se sentou incapaz de conter as lágrimas que escorriam livremente pelo rosto. Eram assim, todos os dias, desde que perdera Tiago, desde que perdera a única pessoa que pensou amar. Ela tentou enxugar as lágrimas, escutando os passos que voltavam em sua direção mais era tarde demais, porque Max já tinha ouvido as fungadelas. Ela queria colocar o rosto entre os joelhos e não se mexer, pois sentia vergonha em chorar na frente das pessoas. Achava humilhante de sua parte chorar por alguém que a desprezava tanto.

— Helena — disse Max — tudo bem?

Helena não disse nada, apenas levantou o rosto para olhá-lo melhor. Nunca, nem de longe, ele seria parecido com Tiago. Tiago era alto, bonito, inteligente e mais velho. Digno de ser um sonhado vampiro, mas com a pele mais corada. Já Max era pouco mais alto que ela, tinha pequenas sardas infantis no rosto, o que o deixava com um ar doce de ursinho de pelúcia. Enquanto Tiago era perigoso, indecifrável e altivo, Max era pequeno, gentil e impulsivo; tudo para ser um ótimo amigo, nos requisitos de Helena. Ela viu que mais uma vez errara ao presumir que o amava. O que ela amava era a imagem de Tiago, refletida sobre ele. O que fez exprimir mais uma cachoeira de lágrimas.

Ela desejou que ele a abraçasse, e ele também. No entanto, nenhum dos dois teve coragem para fazer qualquer coisa. Max estava confuso, olhando para as pequenas lágrimas cintilantes que desciam pelo rosto de Helena.

— O que foi? — insistiu ele, mais uma vez.

— Nada — disse ela, ignorando os olhos implorantes do novo amigo. — Já chega, isso está virando uma palhaçada.

Ela deu um riso torto e sem humor. Era típico de Helena, sorrir para amenizar a dor das coisas que desciam em sua garganta, arranhando-a. Olhando para Max, ela esperou para ver qual seria a resposta do menino. Ele estava sem fala, confuso com a situação. Por fim, ele abriu os braços, convidando-a. Ela se alojou ali, e chorou mais um pouco. Colocou uma das mãos sobre o peito de Max, e a viu tremer juntamente com o ritmo do seu coração disparado. Os dois respiravam juntos, tentando não transparecer o quanto estavam ofegantes. Por fim, ela adormeceu, e Max a devolveu gentilmente ao colchão. Ele a cobriu e tocou novamente seu rosto, não ficando desapontado quando ela não se mexeu. Ele viu que a menina deixara escapar um lampejo de sorriso, e sabia que ela estava acordada.

Para ele, isso já era bom o suficiente. Para ela também. Por enquanto.



Copyright 2011. Autoria de Bianca L. Spinola - Todos os direitos reservados. Proibida cópia parcial ou total deste conteúdo sem autorização expressa do autor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário